Passados quase dois dias do famoso telefonema e já amenizadas as imbecilidades de fanáticos como os que acreditam que Trump realmente se encantou com o charme do descondenado, podemos recordar rapidamente o que houve até aqui e tecer alguns comentários sobre o que pode acontecer a seguir.
O Molusco não queria a reunião. Um presidente interessado no bem do país a buscaria de imediato, mas o malandro achou que faturaria politicamente com a história de que o Brasil estava sendo atacado e encheu a internet de propagandas dizendo isso. Eu vi várias, que saíram do ar após ele ser encurralado na ONU.
A mentira de que Trump se recusava a encontrá-lo era tão boba que foi desmoralizada com duas perguntas pela repórter estrangeira. O bloqueio que existiu e ninguém conseguiu furar foi a subalternos que não poderiam tratar do conjunto de temas que os EUA pretendem discutir. Basta lembrar do que Scott Bessent disse à comitiva de empresários brasileiros que foi procurá-lo: "dirijam-se a Brasília".
Pois finalmente Brasília se viu obrigada a entrar em campo e teremos agora reuniões de alta cúpula em que a delegação brasileira será chefiada pelo vice-presidente e os EUA serão representados pelo "ideológico" Marco Rubio.
Os petistas dizem que a ideologia de Rubio ou Trump não fará diferença porque não aceitarão discutir tópicos políticos ou jurídicos, focando-se apenas nos comerciais. Eles podem tomar essa decisão, não há dúvida. O único problema é que se você não discute um tema, não pode palpitar sobre esse tema.
Assim, caso isso aconteça, o outro lado pode continuar falando da taxa do café enquanto dá andamento a assuntos relativos a violações de direitos humanos como, por exemplo, os que envolvem a seção 301, a extensão da Magnitsky aos filhos do Xandão, ao casal Gigi, ao Barrosa e seus filhos, e por aí afora.
O Alckmin não poderia reclamar porque seu lado não quer tratar dessas questões. E restaria ao seu chefe procurar os caras que o levaram da cadeia para a presidência e explicar que eles precisam sacrificar o futuro de suas famílias para alavancar seu projeto político, o que podemos desconfiar que ele não quer fazer.
Ao contrário, disseram por aí que ele quer que retirem as sanções já existentes. Mas se Alckmin colocar isso na mesa, poderá ouvir: "Gerald, isso é jurídico e político, vamos entrar nessa seara? E você quer que eu baixe tarifas e pare processos independentes em troca do quê? Metade da Amazônia? O que você vai me dar?"
Esse é o tipo de complicação que pode acabar desembocando em uma proposta como: "Ok, Gerald, vamos resolver essa parte do problema; você promove uma anistia geral, que é algo político, independente do judiciário, mas eu convenço o Donald a não assinar mais nenhuma Magnitsky contra o pessoal do STF. O que lhe parece?"
Claro que eu estou levantando hipóteses e não sei o que realmente pensam Rubio e Trump. Mas seguindo uma linha parecida com essa você entende por que a conversa não poderia ser com empresários ou gente do segundo escalão. Entende também por que foi necessário fisgar o metido a esperto frente a todo mundo na ONU.
Dá até para desconfiar que, segundo as ideias sobre negociação que colocou em livro nos anos 80, Trump planejou tudo e estamos naquela parte em que ele já se considera numa boa posição e finge um recuo para atrair a presa para a armadilha. Pensaram que ele tinha se encantado, mas na verdade ele é o mago, o encantador.

Nenhum comentário:
Postar um comentário