segunda-feira, 24 de março de 2025

Informantes

Não foi só ela. "Perdeu, mané" foi uma frase escrita em muitos vidros e paredes naquele 8 de janeiro e não parecia ter constituído alguma ofensa especialmente grave. Tanto não era que, nos dias seguintes, o autor da frase original e seus colegas limitaram-se a zombar do "perdel mané" de um dos incivilizados.

Débora, a moça do batom, acabou sendo presa porque foi fotografada pela Folha junto da estátua e exposta no jornal. Mas isso não aconteceu em 9 ou 10 de janeiro, foi apenas no dia 24 daquele mês que ela ganhou a reportagem em que é chamada de "uma mulher do interior de São Paulo" (aqui).

Como a Folha sabia quem era ela e onde encontrá-la? Aí é que está, eles investigaram. Elas, na verdade. Entre os dias 8 e 24, as autoras da matéria, a fotojornalista Gabriela Biló e a repórter Thaísa Oliveira, fizeram o trabalho de auxiliares da polícia subordinada ao STF e foram atrás da perigosa terrorista. 

Pesquisaram em redes sociais, encontraram pessoas que confirmaram, "sob condição de anonimato", que Débora esteve em Brasília. Descobriram que ela tinha posts de apoio às manifestações e havia transmitido os eventos do dia 8 em tempo real, chegaram até a lhe telefonar. 

O trabalho estava completo quando a entregaram ao público com plena consciência de que a estavam também entregando à sanha vingativa do ministro Moraes.

Sim, plena consciência. A essas alturas, mais de duas semanas após o evento, a fantasia de aquilo era um golpe que precisava ser rigidamente punido já estava consolidada, as duas informantes de Xandão sabiam disso. 

Já que tanto fuçaram sua vida, deviam saber igualmente que Débora era uma pessoa simples, uma cabelereira que vivia com o marido e dois filhos pequenos sem fazer mal a ninguém. Nada disso as demoveu. Para ganhar pontos com a direção do jornal que apoiava a versão farsesca, entregaram-na em bandeja de prata.

Pois agora que Débora está sendo condenada a 14 anos de prisão alguém lembrou de tudo isso e a história se espalhou pelas redes sociais, revoltando pessoas pelo Brasil afora. Sentindo o golpe, a Folha chegou a abrir boletim de ocorrência e publicou uma matéria sobre o caso (aqui).

Segundo o jornal, suas funcionárias estariam sofrendo "ataques em massa", ameaças e perseguições. Como toque humorístico, eles ainda reclamam que algumas contas estão procurando "informações pessoais" das duas X9, que fizeram exatamente isso para levar o inferno a Débora e seus filhinhos.

Como não é idiota, o pessoal da Folha sabe muito bem que está mentindo quando trata os acontecimentos de Brasília com um golpe e Débora como perigosa. Deveria adivinhar também que sua turma hoje pode muito, mas não pode esperar que os judeus da história simpatizem com os informantes voluntários da Gestapo.


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