Muito antes de ser o país da piada pronta, o Brasil foi o país da piada. Para dar uma ideia disso, naquele tempo em que o pessoal colocava terno para ir a velório e o café era barato, tinha uma turma que ficava no canto do velório tomando cafezinho e contando, com riso abafado, uma piada atrás da outra.
A piada no velório era uma instituição nacional. Mas ela também era contada no barbeiro, no armazém, em todo lugar. Depois de um almoço de família ou na mesa de um bar, todos podiam ser convocados a contar a sua. E renovar constantemente esse estoque para apresentar uma "nova" era fator de prestígio social.
Não era só aqui, evidentemente, mas nós sempre nos destacamos naquele humor curto e isolado da piada. Veja pelos filmes, nós temos dificuldade para manter um tema geral divertido como o da Pantera Cor de Rosa, mas somos bons nas sucessões de piadinhas que fizeram o nome do Oscarito na época de ouro do cinema nacional.
A chanchada era nossa, criamos até a pornochanchada. Havia livros (grossos) com antologias de piadas. E humoristas que viviam de contá-las, e programas de TV... Era, havia, viviam... Tudo no passado.
Conforme a esquerda foi dominando culturalmente a sociedade, o politicamente correto (avô brasileiro do woke) foi se impondo e jogando as antigas piadas para um cantinho cada vez mais estreito. Não pode rir disso, você pode ser processado se zombar daquilo. O humor não morreu, mas tudo pareceu ficar de repente meio clandestino.
Porém o espírito do povo não mudou e o das antigas piadas reencarnou na internet sob a forma de meme. Conforme mais gente foi dominando a nova tecnologia, criar memes, alterá-los ou apenas transmiti-los (contar uma piada nova) foi se tornando uma irrefreável paixão nacional.
A diferença para o tempo antigo é que isso se limitou à parte do país que engoliu o politicamente correto a contragosto. Para quem levou a bobajada a sério, que é o pessoal mais à esquerda, ficou mais difícil entrar nessa onda. A piada-meme se tornou uma quase exclusividade da direita.
Isso é apavorante para a esquerda porque a piada bem feita tem um poder corrosivo que uma crítica séria raramente alcança. E principalmente porque é mais difícil censurar a piada que a crítica, algo que pode ser exemplificado pelo ridículo passado pelas agências de checagem que desmentem memes.
Essa é uma vantagem que a direita leva nessa disputa. Ou duas, pois entrar em sintonia com uma tendência popular que havia sido artificialmente sufocada é mais importante que criar mais memes. E assim será enquanto os adversários reclamarem dos outros por estarem presos na prisão que criaram para si mesmos.
Sabe da última? A esquerda está dizendo que, depois do hino e da bandeira, a direita sequestrou o bom humor nacional.
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