sexta-feira, 24 de janeiro de 2025

Não adiantou queimar ninguém

Esses dias alguém fez uma boa comparação entre as redes sociais e a impressão em larga escala, iniciada quase 600 anos atrás. No começo todo mundo se entusiasmou com a possibilidade de fazer um texto chegar a centenas ou milhares de pessoas, surgiram escritores, impressores, livreiros, leitores. Mas depois...

A primeira obra impressa por Gutemberg foi a Vulgata, a versão da Bíblia traduzida para o latim aceita pela Igreja (na época, só a Católica). E até aí estava tudo bem. Porém a coisa  mudou de figura quando alguns rebeldes passaram a traduzir os livros bíblicos para as linguagens comuns e imprimi-los em grande quantidade.

A luta da Igreja contra os tradutores independentes já era secular e feroz, com gente morrendo na fogueira e o restante, mas até então eles pouco incomodavam porque seu alcance era limitado. Agora não, era fácil produzir cópias e distribuí-las. E qualquer integrante da minoria que sabia ler teria acesso a elas.

Como Barrosos daquele tempo, os próceres eclesiásticos se apavoravam: o que será desses manés expostos a deturpações das verdades eternas que só nós, iluminados, temos capacidade para definir? Suas almas arderão no fogo do inferno por culpa dos disseminadores de desinformação.

Mas o inferno com fogueira e diabinhos vermelhos de tridente na mão era a verdadeira fake news em termos bíblicos, pois não aparecia em livro algum. E quanto às interpretações divergentes, quem poderia realmente garantir que o tradutor ou seu leitor estavam errados?

A luta foi longe, impressoras e livros foram destruídas, mais pessoas foram presas e mortas. Mas no fim os Barrosos perderam mais do que pensavam inicialmente. Boa parte da cristandade abandonou definitivamente a Igreja Católica e passou a se abrigar em outras denominações.

Os iluminados que se cuidem, desta vez pode ser pior.

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O Google informou à União Europeia que não utilizará serviços de checagem de fatos nos resultados de buscas e nos vídeos do YouTube. Em carta, a empresa declarou que o Código de Práticas de Desinformação proposto pela UE "simplesmente não é apropriado ou eficaz" para os seus serviços e não pretende segui-lo.

Segundo o seu presidente de assuntos globais, Kent Walker, o modelo de moderação do Google já funciona bem e sua direção vê um "potencial significativo" no sistema de Notas da Comunidade que começa a ser implantado no YouTube.

Chupa UE! Vai sobrar só o Barroso.


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