quinta-feira, 23 de janeiro de 2025

Amigos da onça

Acho que quase todo brasileiro conhece o Amigo da Onça, personagem criado em 1943 pelo cartunista Péricles por sugestão de seu editor na revista O Cruzeiro. E a maioria também deve saber o que significa a expressão que originou seu nome, muito utilizada no país por décadas.

Amigo da onça é o falso amigo, o sujeito que se veste de bombeiro para ver o circo pegar fogo, o sacana que finge ser amigo para tentar lhe ferrar. Dizem que a origem do nome vem de uma piada conhecida em seu tempo:

Dois caçadores estão acampados no mato. Um pergunta o que outro faria se aparecesse uma onça e este responde que lhe daria um tiro. E se você não tivesse uma arma? A enfrentaria com uma faca. E se não tivesse faca? Usaria um pedaço de pau. E se não encontrasse nenhum pau? Subiria numa árvore. E se não houvesse árvore próxima? Sairia correndo. E se ficasse paralisado pelo medo e não conseguisse correr?

Aí o outro se enche e pergunta: "Para aí, você é meu amigo ou amigo da onça?"

O diálogo entre os dois pode parecer distante para o citadino de hoje, mas revela uma realidade que todos conheciam naquele Brasil preponderantemente rural em que se contava piadas e era natural falar em caçadores: onças não são bichinhos de pelúcia ou pets, são feras que podem atacar animais de criação e seres humanos.

O maior perigo é para os animais. Pesquisando ataques recentes a humanos só encontrei dois que terminaram em morte ou graves ferimentos. Mas muitos podem não ter sido  notificados porque a vítima não precisou ser hospitalizada e ninguém pode saber se será premiado nessa loteria ao contrário.

É por isso, mais que para responder a ataques de criminosos, que armas eram necessárias no campo em 1943 e continuam sendo hoje. Se uma onça aparece é preciso espantá-la. Ou caçá-la como fez esses dias uma moça que saiu atrás da que rondava sua propriedade com os cachorros da casa e espingarda na mão. 

Junto com ela foram seu pai e alguém que filmou tudo com celular e colocou numa rede social. Eles encontram a onça no alto de uma árvore, a moça a derruba com um tiro e solta a tensão comemorando. Os cachorros se atiram sobre a caça ferida, o pai bate na sua cabeça com um pedaço de pau... e minutos depois a onça está morta.

Morta pra você, seu insensível, as redes se encheram de internautas comovidos com a "tortura e morte" do pobre animal. O Ibama se mobilizou para encontrar a assassina e jornais como O Globo publicaram cenas do filme para que alguém possa identificá-la (o que parece que acabam de conseguir).

Pois é, essa é a moral da história. Ninguém é amigo da moça, o Brasil de hoje está repleto de amigos da onça.


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