quinta-feira, 7 de março de 2024

A inefável magia das runas

Como todos fomos informados dias atrás, a egrégia congregação de Taumaturgos, Sibilas e Encantadores decretou que será terminantemente proibido criticar as runas teutônicas durante a próxima estação de consultas, a ser realizada, de acordo com nossas ancestrais tradições, nas primeiras semanas da primavera.

Não que as denúncias não tenham lá sua lógica. Como os magos não permitem que a configuração assumida pelas runas após cada lançamento seja registrada em pergaminho, seria teoricamente possível que eles inventassem as interpretações que preferissem sem que ninguém pudesse contestá-los.

Também é verdade que existem exemplos históricos de oficiantes que traíram seu dever sagrado e se deixaram subornar por interessados em conquistar uma dama que se recusava a trair o marido, ser nomeado para um cargo que lhe era reiteradamente negado ou obter qualquer outro tipo de vantagem.

Enganado pelo falso oráculo, o consulente tinha sua boa-fé fraudada e acabava, com o perdão da palavra, por ser enrabado pelo subornador (literalmente, num dos casos citados). Mas isso aconteceu num passado remoto e em lugares distantes, a humanidade se transformou de lá para cá, e progrediu ainda mais entre nós.

Alguns nos criticam pela confiança depositada nos magos/sacerdotes, só comparável a encontrada em teocracias tibetanas. Porém nós, progressistas como somos, temos que dar o exemplo ao mundo que se espanta com nosso avanço moral e nos elogia, embora ainda não esteja preparado para nos imitar.

Assim, amigos, nada de críticas às runas teutônicas, nada de insinuações sobre a possibilidade de seus resultados estarem sendo manipulados. Afinal, isso nos levaria a colocar em dúvida a santidade dos sacerdotes e sacerdotisas que as guardam, ofendendo aos próprios deuses que os escolheram para tão elevada missão.

Nenhuma heresia será permitida. Nós vamos até contratar especialistas que pesquisarão os textos divulgados no período e eliminarão os que mencionarem as runas teutônicas. E não adiantará substituí-las por termos como "brumas tectônicas" e fazer jogos de palavras para criticá-las fingindo falar de outras coisas. Frasistas não passarão.

Boas e más notícias do 7 de março

321 - Constantino decidiu que o dia de descanso semanal seria o do Sol Invicto, o dies dominica (Dia do Senhor) ou domingo. E todos obedeceram. Bons tempos aqueles em que ninguém ousava criticar a ordem de um Constantino, um César, um Alexandre.

1557 - Um grupo de hughenotes chegou à Baía da Guanabara. Eram poucos e pareciam inofensivos. Mas, como protestantes, foram os precursores desses abomináveis evangélicos que hoje se recusam a dialogar com quem só quer lhes abrir os olhos.

1808 - Quem chegou ao Rio neste ano foi a família real portuguesa. Ela não mandava tanto quanto os antigos imperadores, mas aquele ainda era um mundo em que os súditos sabiam seu lugar e não ficavam contestando as autoridades nas redes sociais.

1876 - Graham Bell patenteou o telefone. Parecia algo legal, mas foi através dele que, um século depois, a internet passou a ser usada pelo povo e tudo logo degringolou. Talvez fosse uma boa ideia cortar o mal pela raiz e proibir também o telefone.

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