sábado, 22 de abril de 2023

Terra dividida à vista

E tem a nossa divisão mais antiga: Cabral chegou aqui por acaso, ao desviar um pouquinho mais para a direita na corrente rumo ao sul do mar oceano, ou os portugueses já sabiam que havia terra por essas bandas? Descobrimentistas ou conhecimentistas? Um acaso ou o primeiro grande complô do futuro Brasil?

Eu sou descobrimentista, mas sem prova alguma, só porque acho a história mais legalzinha. O Fernandes é conhecimentista por motivos comerciais, o pessoal do vilarejo inventou que os gajos desembarcaram lá antes do Cabral e ele acha que isso vai atrair turistas e bombar o skybunda.

A polêmica ainda não empolgou a Foice e veículos equivalentes. Mas, se um dia eles tomarem uma posição, seja ela qual for, já sabemos o que acontecerá. Quem pensar o contrário será chamado de negacionista e terá suas referências ao tema classificadas como fake news pela Lupa.

Se for o STF então, nem é bom pensar. Quem não adotar a interpretação do olimpo judiciário poderá ser preso a pão e água sob a alegação de... bem, nem precisa. A única esperança de quem tiver outra opinião é que a qualquer momento o Gilmar Mendes pode acordar invocado e mudar seu voto.

Os professores e estudantes de História deveriam discutir arduamente esse tema, mas, pelo que se vê por aí, é mais provável que o coelho saído desse mato acabasse sendo uma tese com um título como "Navegantes e invasores - O papel das mulheres negras nos esforços para impedir o genocídio dos povos indígenas do século 16".

Acha difícil? Você não conhece a criatividade dos caras. É só lembrar que os portugueses já compravam escravos na África há algum tempo e imaginar uma dessas infelizes criaturas, com aquela voz de escrava de O Vento Levou, dizendo ao seu amo: "Faz issu não seu Cabral, dêxa us pobre duzíndiu quieto".

É uma pena que seja assim porque a polêmica original estão tão inserida em nosso DNA que se manifesta em quase tudo o que fazemos. Você acha que vai se dar bem na vida acertando na loteria ou dando a grande tacada? É descobrimentista. Acredita que só dá para enriquecer com truques e conchavos diversos? Conhecimentismo na veia.

O brasileiro pode até inverter sua posição habitual em uma ou outra oportunidade, mas sempre vai girar em torno dessas duas opções. Eu mesmo, normalmente descobrimentista, passei a acreditar que a história do 8 de janeiro foi uma armação em que o desgoverno atraiu as tias do zap para uma armadilha.

Já quem é descobrimentista nesse assunto pensa o contrário. O pessoal que fazia a segurança do palácio o abandonou por acaso, do nada, coincidentemente no momento em que os ônibus com as tias chegavam. O último a sair, meio descuidado, esqueceu de trancar a porta. E foi o que bastou.

- Porta aberta! - gritou dona Gertrudes como cinco séculos antes havia gritado o marinheiro no caralho, que então era apenas aquela cestinha no mastro mais alto (isso foi uma das poucas coisas que de lá para cá se alterou).

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