Arca bolso

Depois que o Paulo Freire lhe garantiu que podia falar "menas" porque o pessoal entendia, o sindicalista malandro nunca mais se preocupou em aprender português. Aí os amigos o levaram da cadeia para a presidência e ele decidiu que devia oficializar sua nova gastança com um plano qualquer.

- Mas está errado, não pode ser assim.

- Como que não pode? É o que nós queremo fazer. Desta vez tá mais difícil roubar, mas vamo gastar sem limite e, quando faltar dinheiro, a gente projeta uma arrecadação maior pra frente e aumenta os imposto pra classe média gastadeira quem duas TV em casa botar a mão no bolso e arcar.

- Isso eu entendi, presidente, vamos ferrar esse pessoal que vota quase todo no fascista. Mas bolso é com L de "faz o L". E as duas palavras precisam ser separadas, "arca" e "bolso", não "arcabouço".

- Mas será que tu, que é um professorzinho mequetrefe que nem dá aula, quer saber mais que o Paulo Freire? Se ele disse que tanto faz é porque tanto faz. Coloca como eu escrevi, até porque esse negócio de bolso vai lembrar o Bolsonaro. E eu não quero mais discussão sobre isso.

- Está certo, me dê apenas uma semana para que eu possa fingir que fiquei estudando e criei o plano sozinho. Assim, como combinamos, quando der merda o senhor dirá que a culpa é minha e me demitirá.

- Isso, isso. Agora sai que eu tenho que explicar pro Putin que só quis encostar a anta bem longe do país e não vou deixar ela usar o banco para financiar projeto de armazenagem de vento.

Também tem o Cala Bolso disfarçado de calabouço, a tentativa de intimidar os apoiadores de Bolsonaro através da prisão de centenas de pessoas que nada fizeram além de protestar em Brasília no 8 de janeiro. Mas nesse caso a confusão foi intencional, uma ironia destinada a reforçar a perversidade da medida.

- Fui eu que dei a ideia sim. Aproveitei um dia em que os dois enxeridos não estavam e convenci os oito do bem a deixar esse jogo de palavras implícito na medida, de maneira que os bolsonaristas, grosseirões tacanhos como são, jamais o percebessem.

- Ah, você é demais. Eu te conheço desde os tempos em que os meninos da escola batiam na gente por causa do nosso jeitinho, mas confesso que você sempre me surpreende. Adoro isso, amo de paixão! Você é mesmo maléfica.

- Por falar nisso, você viu esse último jornalista que nós adquirimos. Agora ele está usando pesquisa Datafolha, feita com esse povão que de juro só entende que quer pagar prestação menor no carnê, para dizer que a taxa básica do Banco Central deveria baixar. Não é uma maravilha? E é dos nossos também, posso garantir.

- Tomara que você tenha razão, pois eu confesso que que me sinto como aquela nossa amiga cartunista quando o vejo. Será que, se o convidarmos, ele vai numa das nossas festinhas secretas?

- Acho que vai sim, deve estar até ansiosa pelo convite. A propósito, faremos uma em breve para comemorar os 100 dias de prisão daquele pessoal. Todas nós fantasiadas de idosa golpista. Vai ser um arraso, você não pode faltar.