segunda-feira, 8 de agosto de 2022

Espelho deturpado

Dias atrás nós sugeríamos que a esquerda brasileira esquecesse aqueles costumeiros paralelos com o nazifascismo e recuasse mais um século, comparando a situação atual com a que precedeu a Revolução Francesa. Mas a turma fez exatamente o contrário e avançou para a época das Diretas Já.

Ficou ainda pior, pois, além de todas as outras imensas diferenças entre os dois momentos, eles agora não só se comparam a uma versão mais jovem de si mesmos como imaginam que podem voltar àquele tempo.

Fizeram um manifesto assinado por artistas e o leram na escadaria da faculdade? É só fazer outro. Fulano discursou e ainda está vivo? Que discurse novamente. E assim eles vão, como a senhora já idosa que, ao sentar na mesma poltrona e na mesma pose, se recorda da imagem que o espelho lhe mostrava décadas atrás.

Talvez ela até acredite que não mudou tanto assim, todos se enganam um pouco com isso. E caso se reúna com amigas da mesma idade as lembranças comuns tornarão a sensação ainda mais forte. Mas basta sair daquele ambiente controlado e andar até o supermercado mais próximo para perceber a diferença.

Ninguém mais espia disfarçadamente seu decote ou suas pernas, muito menos alguém assovia ou se vira para olhá-la, os atendentes a tratam respeitosamente por "senhora", se um puxa assunto é para compará-la a uma mãe ou uma tia. O tempo passou, a situação é completamente diferente.

Com as tias do manifesto dos banqueiros é a mesma coisa. Elas podem se iludir enquanto estiverem tomando chá com as companheiras no mundo virtual, mas faltam-lhes admiradores de carne e osso. As multidões que se manifestavam no tempo das Diretas Já agora estão do outro lado.

Mas deixemos que elas descubram isso quando, maquiadas e enfiadas quase à força naquela minissaia que fez tanto sucesso há meio século, ficarem literalmente sozinhas no meio da rua.


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