Tem milhões e milhões de brasileiros quietos (...) Eu vou saber o que eles vão fazer em outubro, eu não sei o que eles vão fazer. Mas acredito que tudo que a gente está vendo está errado, a gente não sabe o que vai acontecer. E, trabalhando nos veículos em que eu trabalhei, geralmente Globo, era todo mundo de esquerda.
A declaração foi feita recentemente por Tiago Leifert, que saiu da Globo e não se considera nem de esquerda nem de direita (entre o ex-detento e o atual presidente, não vota em ninguém). Aliás, foi por isso que ele ganhou um lilás na nossa luta pioneira para substituir as aspas em parágrafos pela cor (nosso "todes").
Tiago também diz que se irritava com os coleguinhas que "esqueciam" coisas como os bilhões devolvidos e queriam negar que a gang do molusco assaltou organizadamente o país. Mas o que mais nos interessa são outras duas declarações dele. Em lilás:
Eu acho que todo mundo que xinga o eleitor do Bolsonaro de idiota, escroto e não sei o quê, está ajudando a eleger o Bolsonaro. Talvez eles não percebam, mas eles estão cada vez mais dando votos ao Bolsonaro. Você está jogando no colo do cara. Estou falando isso como profissional de comunicação. Eu não entendo como alguém da campanha fala: 'Cala a boca, você tem que conquistar essas pessoas, não falar que ela é uma deplorável'. É óbvio, é o básico do básico. Ele (Bolsonaro) vai ganhar, é um erro de estratégia.
É a sensação de que você é um enviado dos céus e veio aqui ensinar as pessoas o que elas devem fazer. E alguns colegas caem nessa armadilha. Esse é o problema para mim.
A armadilha é dupla. Ser esquerdista é ter acesso ao conhecimento reservado aos eleitos, andar pela rua olhando com um misto de compaixão e desdém para aquelas multidões alienadas que correm atarefadas sem imaginar que tudo se deve à luta de classes ou algum outro mecanismo que o profeta explicou.
Do outro lado da arapuca, a imprensa era, até pouco tempo atrás, praticamente a única voz a poder falar para toda a sociedade. Mesmo o político ou artista famoso precisava tratar o jornalista com toda a deferência para não ter sua carreira prejudicada. Ele também estava acima dos comuns.
Ser um bom jornalista e um esquerdista já seria individualmente complicado. Vivendo desde a faculdade num meio em que quase todos são as duas coisas e as confundem, o pessoal tende a achar que isso é natural e a tratar a opinião de fora com o mesmo desprezo votado aos coitados que escreviam cartas para os jornais nos velhos tempos.
Vem daí a irritação com que essa turma trata o eleitor de alguém que os confronta abertamente como Bolsonaro, a tentativa de ofendê-lo dizendo que ele pensa que a terra é plana, é um ressentido que defende genocídios ou coisa equivalente.
Acredito que alguns intuam que isso equivale a chamar o sujeito de evanjeque e no minuto seguinte soltar o "temos que conversar com os evangélicos". Mas a maioria não se contém e, ao invés de frear, pisa no acelerador. É como se eles decidissem gritar cada vez mais alto para ver se os ignorantes escutam e aprendem.
Porém o máximo que conseguem é, como disse o Tiago, que alguns entre os que pensam de outro modo evitem se manifestar. Uma senhora que era minha vizinha dos anos 90 já dizia que nunca discordava dos petistas porque eles "chamam a gente de burro".
Supondo que algumas são sérias, essas coisas podem até afetar as pesquisas de opinião e explicar por que elas só erram a favor da esquerda. Sentindo que está frente a algo deles (da imprensa, da esquerda), o pesquisado age como a minha antiga vizinha. Por aí também, é como diz o Tiago:
Acredito que tudo que a gente está vendo está errado (...) Ele vai ganhar, é um erro de estratégia.
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