quarta-feira, 4 de maio de 2022

Jabuticaba ditatorial

Se no Brasil eles mentem, eu imagino o que eles não dizem a quem só tem uma vaga ideia do que se passa por aqui. Vivendo por lá, em Genebra, Jamil Chade se dedica a apresentar o testemunho de quem acredita em suas histórias como se fosse a opinião "do mundo". Sua última coluna no UOL começa assim:

O que está em jogo em 2022 nas eleições no Brasil é a democracia. O alerta é da vencedora do prêmio Nobel da Paz de 2021, Maria Ressa. A jornalista das Filipinas foi escolhida para receber a premiação num gesto deliberado por parte dos organizadores do Nobel para mostrar a relevância da imprensa para a democracia e para a paz. Segundo Oslo, ela usou "a liberdade de expressão para expor o abuso de poder, o uso da violência e o crescente autoritarismo em seu país natal, as Filipinas".

Nem é preciso ler o artigo para saber o resto do enredo. Mas saberá Maria que nós temos jornalistas presos e até exilados? Terá lhe contado Jamil que inquéritos são abertos de modo tão irregular que as pessoas nem imaginam do que são acusadas? Que uma pena por "delito de opinião" pode ser maior que a de muito assassino?

Maria sabe que as ditaduras modernas mantêm a aparência de legalidade agindo através dos tribunais. Processada em vários deles por motivos diversos, ela é tratada como um joguete, sem nunca saber o que pode ou não fazer. Jamil terá dito que no Brasil já estamos assim?

Claro que não, Jamil jamais teria essa honestidade, pois a censura e as demais deturpações legais são usadas contra os apoiadores de Bolsonaro, não contra os seus opositores. Do lado do presidente não há nenhuma perseguição a indivíduos ou grupos indefessos, só defesa de eleições auditáveis e liberdade de expressão.

Essa nova jabuticaba deve ser mesmo difícil de entender. Associações entre perseguição política e governo ou perseguidos e imprensa estão tão fixadas na mente das pessoas que até no Brasil, com os fatos lhe esbofeteando a cara diariamente, há quem acredite mais nos que as invocam para manipulá-lo do que em seus olhos.

Seria preciso explicar para a Maria o que é o lulopetismo e sua corrupção institucionalizada. Como ele tentou se eternizar no poder através do modelo bolivariano, mas não conseguiu cooptar as forças armadas e perdeu a eleição, restando-lhe exercer poder através dos tribunais que aparelhou e da imprensa que comprou.

Nada disso Jamil disse porque ele faz parte dessa estranha imprensa que defende a censura e se cala sobre a prisão ilegal de colegas que não compactuam com o esquema. Pobre Maria, convencida de que é Bolsonaro quem está fazendo isso, caiu na conversa do malandro. Como se lê em outro parágrafo da sua coluna:

Para a eleição no Brasil, Maria Ressa sugere que uma reação não venha apenas de um grupo de jornalistas ou de segmentos da população. "Deve ser um trabalho de toda a sociedade, como tentamos fazer nas Filipinas. Mobilizar não apenas jornais para trabalhar juntos, mas também grupos da sociedade civil para parar a onda de mentiras", recomendou. "Tragam pesquisas acadêmicas, para mostrar como estão sendo manipulados, além de advogados e especialistas em direito", sugeriu.

Jornalistas como Jamil já destacam a opinião de acadêmicos, mas da mesma turminha. E eles adorariam mobilizar amplas camadas da população. Só que não conseguem, Maria. A gente salientou aqui na segunda. Para levar pessoas às ruas e coisas do tipo é preciso contar com a sua motivação, com seu pensamento independente. E eles não convencem ninguém além do gado que nem para ver show grátis se move por si só.

Aliás, show pago irregularmente pela prefeitura, no velho esquema lulopetista que conta com a bovinidade de parte do povo para tentar voltar e instalar sua ditadura de vez.


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