segunda-feira, 16 de maio de 2022

Deixem o imbecil falar

No mesmo sentido em que Olavo de Carvalho disse que a sua grande contribuição para a cultura brasileira talvez viesse a ser o uso da locução ad hominem, não é impossível que, em mais algum tempo, as pessoas só lembrem de Umberto Eco pelo famoso "a internet deu voz a uma legião de imbecis".

Eu li uma entrevista do italiano pouco depois daquilo e ele dizia que, face à internet, os jornais deveriam se dedicar a filtrar o que era verdade ou não, que pessoas de 16 ou 17 anos em geral não têm, pela pouca experiência de vida e leitura, a mesma capacidade de reconhecer um abordagem enviesada e coisas do tipo.

Eu também pensava, no começo da internet, que os jornais tentariam ficar mais cuidadosos, imparciais dentro do possível, diferenciando-se da gritaria nas redes justamente por isso. Me parecia que a melhor maneira deles sobreviverem era como "agências verificadoras" que as pessoas procurariam voluntariamente.

E a imprensa tentou, mas como quem acha que deve ser respeitado só pelo título pendurado na parede, não pelo realmente faz. Um bom exemplo disso foram os moleques da Folha dizendo, no ridículo "Use Amarelo", que as pessoas deveriam adotar a visão do jornal porque este era um sábio de mais de cem anos.

Assim todos caíram na vala geral da Internet, onde podem se acusar mutuamente de fazer parte das legiões imaginadas pelo Eco. E onde realmente circulam muitas imbecilidades. Mas será isso tão ruim?

Veja a tal "teoria da terra plana", que se tornou um assunto relativamente bem comentado nas redes tempos atrás. Alguém foi obrigado a escutar os argumentos dos defensores da ideia? Alguém terá se transformado obrigatoriamente em terraplanista por fazê-lo?

E o mesmo acontece com a maioria das imbecilidades da internet, atraem alguns poucos, mas se tornam apenas ruídos que dificilmente são ouvidos por quem não se interessa por eles. Por que se preocupar tanto com isso?

Me parece claro que o verdadeiro incômodo é justamente a parte boa da história, não a ruim. O cara que tinha acesso à imprensa estava acostumado a falar apenas para o seu grupinho e/ou sem contestação quando, de repente, surgem esses desconhecidos atrevidos que desmontam sua argumentação. Onde já se viu?

Deve dar raiva mesmo, ainda mais quando os críticos têm razão. Alguns se escondem para manter a pose. Outros, tentam sair por cima e se escoram na frase do Eco para recuperar a vaidade estilhaçada.

Frase que acaba perdendo um pouco o valor porque, repito, qualquer um pode usar. Até o ministro careca a utilizou esses dias. Mas ouvir bobagens é o custo de dar voz a todos, a outra opção é muito pior. É por isso que sempre que a escuto, eu penso comigo: Deixem o imbecil falar.

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