O Chavez que eles gostam mesmo é aquele da Venezuela. Mas ao tentarem vender sua luta do bem contra o mal (nova versão do clássico lulopetista "nós contra eles"), alguns militantes de redação acabam lembrando o personagem do seriado. Um deles é o Ricardo Kotscho, que começa sua última coluna citando um coleguinha mais raivoso:
"Sem fomentar desde agora um movimento nacional pela democracia, a Besta botará sua turba e suas tropas na praça. Há que se desmascarar o golpe que vem aí, óbvio. Mas denúncias viram berreiro estéril se não forem seguidas por ações firmes. E a Besta usa o bate-boca para perturbar", escreve Mario Sergio Conti em sua coluna de sábado na Folha que acabo de ler no online da Folha.
Beleza, Mario, concordo com tudo que você escreveu, as tuas onze receitas para sairmos dessa pasmaceira paralisante, mas quem comandará as "forças desarmadas" defendidas pelo ministro Edson Fachin, aquilo que já chamamos em outros tempos de sociedade civil, na luta pela volta da democracia, ora novamente ameaçada. Kotscho estará preocupado com os colegas já presos ou exilados? Se fosse isso teria toda a razão, pois se apenas com o domínio do supremo eles já estão assim, prendendo e soltando quem e quando querem, imagine se tomarem também a presidência. Mas é evidente que não se trata disso. O que ele teme é a ditadura bolsonarista, a Besta que não ataca, não prende nem censura ninguém.
Nesse sentido, a recorrente fantasia do sujeito seria voltar ao tempo das Diretas Já, com multidões nas ruas pedindo o fim da opressão carluxiana ou coisa similar. Mas aí ele olha pro lado e se pergunta: Quem irá nos defender? Quem irá nos comandar? E sua triste conclusão é que só restou o ladrão irregularmente descondenado.
Quem são hoje os líderes da sociedade civil? Sei que eles existem, mas ninguém sabe os nomes, nem por onde eles andam. Quem lidera o empresariado nacional? Quem ficou no lugar de D. Paulo? Quem é o novo Faoro dos advogados? Quem lidera os estudantes, os movimentos sociais? Quem é hoje o grande líder dos trabalhadores? Quem fala em nome dos favelados, dos indígenas, dos negros, das mulheres? Quem sobrou no Congresso Nacional para nos defender? Esse negócio de "sociedade civil" é o núcleo da fantasia. O lulopetismo foi cooptando até a parcela das citadas entidades que não era esquerdista e todas elas mostraram as garras e se desmoralizaram, enquanto os cidadãos ganharam voz direta através das redes.
Ah, a Internet dá voz até aos idiotas. É verdade, mas também é fato que você pode utilizá-las para aquilatar o que pensa realmente a sociedade. Basta convocar uma manifestação popular e constatar. O problema é que Kotscho sabe disso e não gosta do que vê, escandalizando-se até com os tímidos avanços sobre alguns postos que deveriam ser de todos, mas a esquerda usurpou.
De outro lado, redutos antes progressistas como as universidades e as igrejas, centros comunitários e até o movimento dos sem terra, estão sendo tomados por devotos fundamentalistas, milicos, pastores e policiais elegem-se aos montes para os parlamentos, trogloditas tomam conta da cultura, marombados fiéis da Besta saíram dos armários, perderam a modéstia e assumiram o proscênio.
O que será que ele imagina? Devemos criar uma lei para impedir que a minoria que pensa como ele continue a dominar os espaços que deveriam ser de todos? Ele não diz com exatidão, mas, como para nos dar uma ideia, termina colocando ao lado do Bem aqueles que hoje realmente censuram e prendem.
Enquanto Fachin defende as "forças desarmadas", que pregam a harmonia, o amor, a ciência e a justiça, o outro lado libera armas para todos, estimula o bangue-bangue no campo e nas cidades, espalha o ódio nas redes sociais, debocha das suas vítimas e ameaça as instituições. Como eles são lindos, não é mesmo? E o Fachin não está aí por acaso. Kotscho deve pensar que o supremo deve continuar a ser, como as universidades, um reduto de esquerda. No fundo se trata disso, o resto é para disfarçar. Inclusive a choradeira final.
É uma luta desigual, desumana, inverossímil, surreal, sem regras e sem limites, em que as palavras perdem até o sentido e a única lei que vale é a do mais forte. Cada minuto que passa, assistindo à destruição do país, sem reagir, é uma eternidade para chegarmos ao final desta tragédia, se houver mesmo eleições livres e o vencedor for empossado. Parece inacreditável, mas pelo rumo que os últimos acontecimentos tomaram, ainda há controvérsias se isso será mesmo possível. Só não podemos desistir do Brasil. Mas a Besta não está concorrendo, Kotscho? E se ela vencer? Não pode? Você já sabe o resultado da eleição?
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