domingo, 12 de março de 2023

Sob nova direção


A cena se passa num futuro próximo, no escritório da representação chinesa no Brics Bank (ou seja lá como se chame esse cabidão de empregos internacional). O diretor se dirige rapidamente para a saída enquanto o funcionário que acabou de descobrir que foi demitido o segue e tenta argumentar:

- Por favor, senhor, por favor, me explique o que aconteceu.

- O que aconteceu? Você é um incompetente, me faz passar vergonha. E quando eu passo vergonha num organismo internacional é o nosso glorioso Partido que passa junto. Isso é inadmissível. Inadmissível!

- Mas o que eu fiz, honorável diretor?

- Você ainda pergunta, camarada tradutor? Você quer que eu acredite que a nossa presidenta disse que o banco agora não terá meta, mas a meta será dobrada quando for atingida? É impossível alguém dizer uma asneira dessas, eu não preciso falar português para saber que você também não é fluente no idioma que diz dominar.

- Mas ela disse exatamente isso, compreensivo companheiro.

- Pare de insistir! Eu sou compreensivo sim, mas já fui até demais. Da outra vez eu deixei passar, mas duas é demais.

- Que outra vez, augusto orientador?

- Aquela em que você disse que a presidenta pretendia estocar vento, quando, presumo, ela devia estar se referindo à armazenagem da energia eólica sobressalente.

- Desculpe contestá-lo, nobre diretor, mas ela queria guardar vento mesmo.

- Basta, basta! Você quer me convencer que os brasileiros mandaram uma completa imbecil para presidir nosso banco? Retire-se antes que eu termine de perder a paciência e o envie para um campo de reeducação. Fora!

Naquele noite o chinês se reuniu para lamentar com seus colegas tradutores de português, todos igualmente dispensados, numa mesa de bar.

- Tudo culpa daquela anta - disse o russo após entornar a décima vodka.

- Não digo que é uma vaca porque em meu país estas são sagradas - emendou o indiano.

- Não se preocupe - garantiu-lhe o sul-africano -, mesmo para os nossos padrões, vaca seria um elogio para aquilo. Ela é mais burra que o macaco de estimação que eu comprei na minha última viagem a Uganda.

- Você tem um macaco de estimação!? - espantou-se o chinês.

- Cada um com seu gosto. Eu tenho um macaco e você tem um cachorro. Sei porque já o vi passeando com ele.

- Na verdade ele pertence ao meu filho.

- Ah, sim, eu havia esquecido, atrás de toda criança tem uma figura oculta que é um cachorro.


Nenhum comentário:

Postar um comentário