Eu pensei que o assunto estava definitivamente encerrado, mas, como reapareceu de repente nos comentários da semana passada e sempre é interessante desmontar as asneiras dos "intelectuais" da nossa esquerda, vamos aproveitar para desenhar tudo didaticamente uma última vez.
O ponto é que um tal Christian Lynch escreveu que Bolsonaro não é popular entre os mais pobres, que seriam lulopetistas, mas entre a baixa classe média, gente que está um pouco melhor, mas, segundo sua teoria, se ressente com sua condição frente aos que estão acima e não vê possibilidade de ascender.
Na verdade, é muito difícil vincular nível econômico a preferência política e, ainda mais, a um sentimento como o ressentimento. Este último se distribui entre todas as classes e, se fosse para ligá-lo a uma situação política e econômica, seria mais fácil defender o contrário. Basta lembrar do "eles não querem que o pobre melhore" para ver quem utilizava eleitoralmente o ressentimento do povão contra "eles".
Coisa de político, que sente por onde pode entrar na cabeça das pessoas. Do outro lado, há algum discurso parecido contra azelite? Claro que não, porque não há esse ressentimento em grande escala a explorar. Ao contrário, o sujeito mais à direita tende a pensar que dará um jeito de chegar lá por conta própria.
É o esquerdista quem acredita num mundo estratificado em que "eles" oprimem os que estão abaixo e a única maneira de ascender é coletiva, dispondo-se a fazer parte de um rebanho dirigido pelo partido. A esquerda até zomba da esperança de ascensão individual do "pobre de direita" que se imagina amanhã entre "eles".
Mas o esquerdista médio não percebe essas contradições e quer apenas um pretexto para abraçar o que sabe racionalmente ser pior e ainda se sentir um paladino do bem contra o mal. Os Lynch da vida navegam nesse mar dizendo o que ele quer ouvir, embalando seus rancores reptilianos com papel celofane e uma fitinha rosa.
Roda quadrada
O que foi escrito até aqui é óbvio. Mas eu resolvi fazer um pequeno exercício para mostrar que a classificação não se sustentava nem em seus próprios termos. Para tal, considerei situações que podem ser resumidas a três:
A - ganha pouco - ressentido - bolsonarista B - ganha menos - mais ressentido - bolsonarista C - menos ainda - não ressentido - lulopetista
A brincadeira era imaginar que A ia perdendo renda e ficando mais ressentido, mas, quando perdia ainda mais e chegava a C, se tornava magicamente não ressentido e petista. Ou, ao inverso, C melhorava de vida e se tornava super ressentido e bolsonarista.
O primeiro cipó utilizado foi o de que o Lynch não dizia que o cara se torna mais ressentido quando empobrece. E o segundo foi o de que a teoria não previa a mudança de faixa de renda. Mas o aumento do ressentimento é uma decorrência lógica da formulação e as pessoas mudam de renda ao longo da vida.
Se você quer mostrar que o sujeito falou bobagem precisa comparar seu corte da realidade com o cenário maior. Alguém poderia argumentar que um carro com rodas quadradas seria mais seguro porque não desceria a ladeira se você esquecesse de puxar o freio de mão. E seria mesmo, mas...
QED
De cipó em cipó, o colaborador acabou por dizer que o bolsonarista ressentido continua assim se empobrecer e o outro continua lulopetista e não ressentido se melhorar de vida. E isso pelo menos faz sentido. Mas comprova que você encontrará remediados lulopetistas, pobretões ressentidos e todas as combinações possíveis.
Ou seja, mesmo esquecendo o que foi dito no início e desenvolvendo apenas um pequeno detalhe da classificação do "pensador", já se prova que ela é falha como regra geral. Como queríamos demonstrar.
Ainda sem sair da teoria boboca
A admissão de que o camarada não muda de opinião ao mudar de renda exige outra explicação. Quando ele define essa opinião? Quando está pior? Melhor? Onde está o ponto inicial?
E, mesmo considerando que A, B e C são pessoas que nunca mudaram de renda, qual é o limite entre eles? Até quanto o sujeito pode ganhar para ser lulopetista sem ressentimento e a partir de quanto ele se torna um bolsonarista ressentido? Existe uma zona intermediária? Precisaria refinar isso aí.
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