"Às 18h39, repara-se o único contato físico digno de nota, ocorrido entre Roberto Mantovani e o filho da personalidade. Nessa circunstância, esse último, provavelmente exasperado pelas agressões verbais recebidas, estendia o membro superior esquerdo, passando bem perto da nuca do antagonista, que, ao mesmo tempo, fazia a mesma ação utilizando o braço direito, impactando levemente os óculos de Alexandre Barci de Moraes."
Primeiro Mundo é outra história, até relatório policial tem estilo. Por aqui, as conclusões sobre a "desinteligência" ocorrida no aeroporto seriam repletas de "ques" e de repetições desnecessárias dos nomes dos envolvidos: que fulano fez isso, que beltrano reagiu daquele jeito, que fulano então...
Correríamos até o risco de presenciar outra aparição do terrível Sendoque, soberano assírio conhecido por selecionar os cultores da linguagem elegante e empalá-los na principal entrada das cidades que conquistava.
Seu método era infalível. Perguntavam se o sujeito e sua família concordavam em se tornar súditos fiéis de Sendoque. Se ele respondesse "nóis concorda" estava salvo, ganhava vinte chibatadas e passava a trabalhar como escravo. Se conjugasse o verbo no tempo certo, já saía dali para o espeto.
Uma curiosidade envolve os antepassados do ex-presidente Temer, que viviam na região em que Sendoque atuava e, apesar de sempre terem abusado das mesóclises, nunca foram empalados. É que no caso deles esse uso é tão exagerado que os assírios pensavam que eles estavam falando errado.
O escrivão romano não escaparia. Para não dizer "braço" duas vezes, ele se referiu ao "membro superior" numa delas. Do mesmo modo, os envolvidos são chamados de "filho da personalidade" e "antagonista". E essas referências surgem entre os dois nomes, que assim se afastam um do outro no parágrafo, opondo-se como nos fatos narrados.
Que estilo, quanta classe! Mas ele que tome cuidado, pois suas habilidades só são apreciadas em ambientes verdadeiramente civilizados. Sendoque deixou herdeiros que se espalharam pelo mundo e continuam a tentar empalar, ao menos metaforicamente, os que elegem como adversários.
Nunca se sabe ao certo onde se poderá encontrá-los em posição de poder, cometendo impunemente suas arbitrariedades. É melhor não entrar em detalhes, mas, por via das dúvidas, seria recomendável que o policial italiano adiasse aquele antigo sonho de passar o carnaval no Rio de Janeiro.
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